sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Subestimada no início, internet virou protagonista e foi decisiva na eleição.

A participação da internet nas eleições presidenciais deste ano foi mais decisiva do que se imaginava. Especialistas no assunto dizem que a campanha online ganhou formato próprio no Brasil, provocou o segundo turno e, de quebra, deu voz a anônimos, que, por meio das redes sociais, questionaram diretamente o processo eleitoral e seus candidatos, pautaram a imprensa e escancararam feridas sociais, como o preconceito regional.

A primeira campanha eleitoral com uso amplo da internet no Brasil vai ficar para a história não apenas por ter sido a mesma que elegeu a primeira presidente mulher do país. Quem entende do assunto diz que a web ajudou a levar o então presidenciável José Serra (PSDB) para o segundo turno graças à campanha online da ex-candidata Marina Silva (PV), que surpreendeu os institutos de pesquisa ao receber 20 milhões de votos e se gabaritar para a disputa presidencial de 2014.

O coordenador de mídia digital da campanha verde, Caio Túlio Costa, diz que Marina – desconhecida por 60% do eleitorado no começo da disputa – buscou compensar o pouco tempo que tinha no programa eleitoral gratuito (cerca de 1 minuto e 20 segundos) investindo estrategicamente em ações nas redes sociais.
- A gente tinha poucos recursos e tinha que dar um jeito e planejar uma estratégia diferente.

Em cada espaço da rede, a campanha conversou com um perfil de eleitor. No Orkut, os verdes buscaram a simpatia dos evangélicos. No Facebook, os alvos foram a classe média e as mulheres. Já no Twitter, a estratégia foi identificar quem realmente fazia parte da “vanguarda da internet”.

Para Marcelo Coutinho, professor da FGV (Fundação Getúlio Vargas) e pesquisador da relação entre web e eleições, um dos principais fenômenos da campanha foi justamente o papel das redes sociais. Ele diz que os políticos não se fizeram de rogados e tentaram usar o Twitter para pautar a imprensa.

- A diferença fundamental em relação às campanhas de 2006 e 2008 é que em 2010 as redes sociais foram instrumentalizadas como canal de campanha. Com uma participação tão ou mais importante que os sites dos candidatos.

Esse foi o máximo de influência conseguida pelos políticos. Coutinho cita uma pesquisa da FGV que revela que 64% dos eleitores/internautas entrevistados foram buscar em outros cantos da internet informações alternativas ao que ofereciam as campanhas e a imprensa. - Para 52% dos entrevistados, a web permite encontrar o que não há nas mídias tradicionais.

Caso Mayara e os spams
Mas, afinal, quem são esses usuários? Segundo Coutinho, o naco dos 13 milhões de tuiteiros que falaram de política este ano representa a voz de quem já se interessa por informações desse tipo nas mídias tradicionais.
- O importante é que o ambiente digital está sendo cada vez mais decisivo. Pela pesquisa, fica nítido que a rede foi, para os jovens, o grande instrumento de mobilização política.

Foi justamente uma jovem estudante de direito a responsável por uma das principais polêmicas vinculando o Twitter e as eleições. Mayara Petruso vai ter de responder na Justiça por uma onda de preconceito contra nordestinos desencadeada por ela, que no microblog vinculou a vitória de Dilma Roussef (PT) ao voto regional. “Faça um favor a SP, mate um nordestino afogado”, disse ela no Twitter.

O coordenador da campanha digital do PT, Marcelo Branco, disse que o caso serviu para discutir nacionalmente um tipo de preconceito social velado.

- A internet criou um terceiro bloco de formadores de opinião [...] O Twitter reflete uma parcela da sociedade, e lá eu vi grupos fascistas. As manifestações preconceituosas foram a resposta da campanha rasteira, que estimulou o ódio religioso e regional.

Ele se referia a outra faceta das eleições na web este ano: a baixaria. A campanha também vai ser lembrada pelos ataques de hackers às paginas oficiais e pelos spams que entraram nas caixas de e-mails dos eleitores contando mentiras sobre os candidatos.

As polêmicas não foram poucas, apesar de “a massa que usa o Twitter não mostrar esse interesse todo pela eleição”, nas palavras do analista de mídia do Ibope, José Calazans.
- Os assuntos mais comentados ainda foram celebridades e futebol.

Coutinho diz que a participação popular foi pequena porque os brasileiros não querem mudanças profundas nos rumos do país, por isso venceu Dilma Rousseff (PT), candidata do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
- O eleitorado estava menos disposto a mudanças eleitorais. Num contexto desses, as pessoas se envolvem menos com as eleições, ao contrário do que aconteceu com o [Barack] Obama [nos Estados Unidos], onde as pessoas queriam mudança.

É o que pensa Soninha Francine, que trabalhou na campanha digital de Serra. Ela lembra que, na campanha que elegeu Obama presidente, a participação dos eleitores na internet aconteceu porque “o candidato era negro, tinha sobrenome árabe em um país que vinha de dois mandatos de [George W.] Bush”.

São essas diferenças que tornaram bem brasileira a campanha presidencial pela internet. Mas e o futuro? Coutinho responde:
- Ao olhar para 2014 a gente vê o aumento dos meios de comunicação digital. Se a natureza das eleições for de mudança, esse uso vai ser mais intenso e amplo.

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